sábado, 24 de novembro de 2007

Jean Mafra para poucos.



Quando Jean falou de seu trabalho solo que estava em andamento, fiquei curioso pra ver quais os rumos que tomaria sozinho esse moço que vem fazendo um trabalho notável nas letras e vocais da Samambaia Sound Club. O Jean Mafra convida, anunciado no início da apresentação, foi então uma mostra de uma série de canções que, ao longo do tempo, e com diferentes parceiros, Jean lapidou para que chegassem a público. Como ainda não temos essas canções registradas em disco - o que está prometido para breve -, vou deixar aqui algumas impressões dessa apresentação.

Quando o público adentrou o Teatro do SESC, uma nuvem de gelo seco se projetava nas saídas de ar, em seguida, as cortinas se abrem e surge uma única figura, no meio da névoa artificial. Jean faz à capela uma canção que fala situação de estar só no palco, ou de criar só, da relação íntima com a música, executada com técnica e emoção. A seguir, a cena se completa com André Guesser, da Samambaia Sound Club, na batera e Fernando “Zenk” Baasch, da The Claudionors, no contrabaixo. Confesso que senti um estranhamento inicial com essa formação, mas a cozinha formada, dando destaque à voz de Jean, salientou o lado dançante das canções executadas. Zenk se alternou entre baixo e violão, dividindo canções com a voz de Jean. As canções trazem letras de tons sarcásticos, versando sobre um apaixonado por uma modelo em um outdoor ou sobre a delicadeza das pétalas de uma buceta, além de tematizar a própria criação e execução musical. Além de Guesser e Zenk, subiram ao palco Ligia Estriga, da banda Maltines, e Marco Antônio de Lorenzo, da Felixfônica, com uma brilhante participação no trompete e clarineta. Como o próprio Jean salientou, inclusive ressaltando o fato de falar muito, uma atenção à produção seria interessante, já que os convidados foram chamados ao palco em seqüência, o que serviu, pelo menos, para dividir a apresentação em dois momentos, um de participações, com a dança de Jean e da moça que eu, pesarosamente, não recordo o nome, e outro de dar a cara mesmo e mostrar a que veio. Sobre isso, ouvi alguém dizer ao Fabio, parceiro muito freqüente no repertório, que o Jean devia ser "menos" o Jean da Samambaia ao que o Fabio respondeu: "esse é o Jean!" Para poucos "ainda".

No final das contas, o que interessa é que a música de Floripa ganha mais uma força no combate ao tédio e na abertura de espaços para diferentes propostas, o que parece ter sido cumprido pelo Panorama SESC.

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

De onde vêm as cores?



Bem, há algum tempo estava ensaiando inaugurar esse blog e não vejo oportunidade melhor de fazê-lo do que com o lançamento do "comentadíssimo" álbum do Radiohead. Pelo que rastreei até agora, depois de uma tarde de audição e sondagens pela internet, a grande surpresa vem do modo como o disco está sendo distribuído. A partir de hoje, se tornou possível, para aqueles que conseguiram acessar o congestionado site In Rainbows, fazer o download do disco pelo preço que julgar pertinente. Fora isso, um box especial já está a venda, mas com data de entrega só pra dezembro.

A "revolução" que percebemos nesse dia 10 de outubro nada mais é do que uma continuidade do desmembramento, da evolução da relação dos criadores de música com a indústria fonográfica e, se não se tratasse de uma grande banda, poderia passar despercebida ou mesmo ser ridicularizada. In Rainbows abre o precedente de permitir ao ouvinte pagar o que quiser pelo download do disco. Até agora, o modelo de venda de música seguia um padrão parecido com o convencional, com preço já cotado por unidade ou por álbum. Qual a diferença dessa atitude então? Ela tem a ver justamente com a questão da audição. Do valor que se dá à audição de música nos dias de hoje. Por mais que o álbum venha a ser disponibilizado na internet ainda hoje, o estrago está feito: ele foi lançado sem o aparato de uma grande gravadora, amparado apenas na credibilidade que a banda tem entre seus fãs.

Entretanto, cabe perguntar o que essa revolução significa para as bandas em ascensão ou para aquelas que se iniciam. Milhares de bandas ao redor do mundo disponibilizam suas canções gratuitamente seja em sites de hospedagem ou nos seus próprios sites. Isso se deve, talvez, ao fato de que essas bandas surgem num período em que a passagem pelos meios de comunicação se tornou meteórica e a credibilidade desses meios e das gravadoras é constantemente posta em xeque, sobretudo em relação ao universo "alternativo".

Registrar canções hoje em dia já não é algo tão custoso como em outras épocas dado os avanços tecnológicos. Além disso, as bandas que surgem hoje em dia parecem ter outra visão da venda de suas músicas, seja em CD, em mp3, em lojas ou pela internet. Claro que ainda há o peso de um lançamento físico e da promoção feita a partir disso. Mas as bandas que iniciam seus trabalhos parecem, ou só podem, acreditar no poder do "boca a boca" e na força das performances ao vivo. Claro que aí se coloca uma grande diferença. O Radiohead não deixará de fazer shows porque não tem gravadora assinando seu disco. A banda já tem moral suficiente para encarar essa tarefa. Resta perguntar como essa fórmula se adequará, por exemplo, ao mercado brasileiro, já que pop aqui é diferente de pop lá.

Quanto ao disco, não convém tentar escrutiná-lo num primeiro dia de audição, talvez nem em uma vida inteira. Passo por uma audição geral que vai detectando, aqui e ali, pontos a se comentar. De modo geral, acho que qualquer fã de Radiohead que se preze (não) esperaria algo de grandioso ou um novo divisor de águas na carreira da banda. Creio que toda banda que se leve a sério tem o desejo de aprimorar seu trabalho e, se possível, vencer certos moldes de criação, levando algo de "novo" aos seus fãs. De novo o Radiohead traz um álbum conciso em que se pode perceber, sob uma textura que permeia todas as canções, uma variedade de opções de composição, entre aquelas que a banda já demonstrou em outros trabalhos. Não se trata de comparação pra uma lista de melhor disco da banda. Trata-se de avaliar o momento que ela vive em termos de composição e amadurecimento de repertório. Uma banda como o Radiohead não precisa mais de referencial externo para sua criação. Seria possível estabelecer árvores genealógicas entre as canções desde os álbuns oficiais até os b-sides. O que se vê em In Rainbows é uma banda madura, segura de si, dando continuidade ao seu trabalho, sem se importar com os alardes do exterior. As guitarras estão ali, as batidas seqüenciadas também, assim como os vocais "fantasmas" e os violões e os teclados e os instrumentos de corda. Além do mais, a maioria das canções oficiais do álbum, assim como as faixas bônus anunciadas, já foi testada em diversas versões ao vivo pela banda e não serão tão surpreendentes assim pros fãs que acompanham a trajetória da banda. Aos que chegam, há muitos elementos a serem descobertos e reinterpretados numa trajetória reversa da carreira da banda, como a textura característica com a qual se revestiu seu som ao longo dos anos, a inserção de elementos eletrônicos e mesmo seus momentos “anti-canção”. Caberá ao ouvinte pensar em como estabelecer essa relação com a banda seja iniciando pelo novo álbum, seja baixando a discografia e fazendo uma audição cronológica da banda. Para os fãs de longa data sempre é bom se deliciar com o “novo”, mesmo que ele traga um pouco de “mais do mesmo”.

As faixas:

CD 1 e LP
"15 Step"
"Bodysnatchers"
"Nude"
'Weird Fishes/Arpeggi"
"All I Need"
"Faut Arp"
"Reckoner"
"House of Cards"
"Jigsaw Falling into Place"
"Videotape"

CD 2
"MK 1"
"Down is the New Up"
"Go Slowly"
"MK 2"
"Last Flowers"
"Up On The Ladder"
"Bangers and Mash"
"4 Minute Warning"


Algumas fontes:

Radiohead's In Rainbows — Debacle or Brilliant, Forward-Thinking Scheme?

Radiohead, com menos angústia, volta ao contato com o mundo

Com cara de revolução, Radiohead lança 'In rainbows' nesta quarta

Lançamento do revolucionário novo álbum provoca pane em site do Radiohead

Procura dos fãs bloqueia 'site' dos Radiohead

Radiohead's "In Rainbows": Track-By-Track Preview

Radiohead - In Rainbows download

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Espero ter começado bem e apesar de não falar exclusivamente do disco, acho que cumpri o que me proponho aqui que é discutir um pouco o universo musical que me rodeia.